domingo, 31 de maio de 2009

terça-feira, 26 de maio de 2009

.......... ergue-se na lonjura uma árvore,
breve sombra,
e um grito entre a súplica e a lucidez
alga seja o mar para onde olho–
de onde te espero
manso

para que eu entre com vagar
para que passeie ao longo da
costa
com a água a subir até aos joelhos
seja a alga que se enleia no tornozelo
um prenúncio dos teus cabelos
ou que da que ali se enrosca e segura
possa fingir a tua vontade
de me levar a ti

domingo, 24 de maio de 2009

Talvez um deus exista para parar o esquecimento
e o passadiço de madeira que todos os dias
me poderia levar até mar não desapareça
sob o peso das pálpebras que é como quem diz
sob as construções na areia que nunca fiz
de tal forma me habituei a aprumar o desassossego
Talvez um deus exista na solidão de cada seixo
que ficou por fotografar a preto e branco
como antigamente quando ainda era possível
atravessar o tempo que há-de vir
com os cordões desapertados sem termos
que regressar à infância
para fazer destes malabarismos
com as coisas que deixamos por fazer
Talvez um deus exista para além da incidência desta pouca luz
sobre a passagem onde nem um passo se desvanece
onde só o esquecimento repetidamente deflagra
e em cada golpe de silêncio eu ainda acredite
que há palavras poisadas sobre os lábios
e que as podemos adivinhar
É bom ouvir de noite uma trompa de caça
Despir depressa a túnica da Lua
E descobrir o amor no forro de uma casa
onde apenas vibrava a memória da chuva
À altura de todas as estrelas
coloco as mãos para tocar o vento.
A lua é um fascínio
que deixa atónito o meu corpo,
e lhe dá um cheiro de fêmea fecundada;
um fogo posto a deixar um luar,
pleno, detido nos meus olhos.
Passeio-me, longamente,
pelo lado mais insensato das palavras
e digo o nome do último pássaro nocturno,
como se nele repetisse um primeiro adeus,
tão súplice, tão magoado.
Um tango exausto sobe-me pelas pernas.
Há, na minha boca,
uma rua silenciosa,
por onde se chega à fragilidade dos lábios.

sábado, 23 de maio de 2009



Bebeste uma lágrima
De Poesia nos meus lábios
Sedentos de amor...

quinta-feira, 21 de maio de 2009


Apetece-me fugir para dentro dos teus olhos.
Apetece-me fugir para o longe que os teus olhos vislumbram.
Como se fosse um sonho, uma viagem de infância, iremos os dois.
O tempo que não temos,
a terra do nunca.
Nunca dizer que não a um desejo.
A uma vontade.
A um amor.
Nunca dizer não.
Amar-te assim, acima de todas as coisas.
Apetece-me......
"As coisas sonhadas só têm o lado de cá........
Não se lhes pode ver o outro lado...
Não se pode andar à roda delas...
O mal das coisas da vida
é que as podemos ir olhando por todos os lados...
As coisas de sonho só têm o lado que vemos...
Têm amores só puros, como as nossas almas."
Temporalidade
"há sobretudo o sonho
há o cansaço
há a desordem
o gole estrangeiro de invólucras almas,
há sobretudo a memória,
o mundo samba nos meus pensamentos,
há sobretudo eu mesmo
e se não ha eu mesmo
resta
apenas um corpo oco
que vagueia na simples caricatura
da irrealidade real de um existir
há sobretudo ser
sonho."

quarta-feira, 20 de maio de 2009


na palma da mão
um sonho vago:
um coração de pássaro.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Em Creta
Onde o Minotauro reina
Banhei-me no mar

Há uma rápida dança que se dança em frente de um toiro
Na antiquíssima juventude do dia
Nenhuma droga me embriagou me escondeu me protegeu
Só bebi retsina tendo derramado na terra a parte que pertence aos deuses

De Creta
Enfeitei-me de flores e mastiguei o amargo vivo das ervas
Para inteiramente acordada comungar a terra
De Creta
Beijei o chão como Ulisses
Caminhei na luz nua

Devastada era eu própria como a cidade em ruína
Que ninguém reconstruiu
Mas no sol dos meus pátios vazios
A fúria reina intacta
E penetra comigo no interior do mar
Porque pertenço à raça daqueles que mergulham de olhos abertos
E reconhecem o abismo pedra a pedra anémona a anémona flor a flor
E o mar de Creta por dentro é todo azul
Oferenda incrível de primordial alegria
Onde o sombrio Minotauro navega


Pinturas ondas colunas e planícies
Em Creta
Inteiramente acordada atravessei o dia
E caminhei no interior dos palácios veementes e vermelhos
palácios sucessivos e roucos
Onde se ergue o respirar da sussurrada treva
E nos fitam pupilas semi-azuis de penumbra e terror
Imanentes ao dia –
Caminhei no palácio dual de combate e confronto
Onde o Príncipe dos Lírios ergue os seus gestos matinais

nenhuma droga me embriagou me escondeu me protegeu
O Dionysos que dança comigo na vaga não se vende em nenhum mercado negro
Mas cresce como flor daqueles cujo ser
Sem cessar se busca e se perde e se desune e se reúne
E esta é a dança do ser





Em Creta
Os muros de tijolo da cidade minóica
São feitos com barro amassado com algas
E quando me virei para trás da minha sombra
Vi que era azul o sol que tocava o meu ombro




Em Creta onde o Minotauro reina atravessei e vaga
De olhos abertos inteiramente acordada
Sem drogas e sem filtro
Só vinho bebido em frente da solenidade das coisas –
Porque pertenço à raça daqueles que percorrem o labirinto,
Sem jamais perderem o fio de linho da palavra






segunda-feira, 18 de maio de 2009

"Se eu pudesse, seria mais sensata;
mas uma força nova
arrasta-me contra a minha vontade,
e o desejo atrai-me a uma direção,
e a razão, a outra:
vejo e aprovo o melhor,mas sigo o pior."

sábado, 16 de maio de 2009

Hoje, confesso, acordei com vontade de ser feliz.
Amarrei, até, no pulso o amor-perfeito
que foi secando no meu peito e retomei a velha máxima:
não deixar que qualquer angústia atinja o coração.
Um castelo de areia, é tudo quanto quero
para acostar o meu barco de papel.



Aproxima os olhos da vertigem e estremece
com a luz espessa, que brilha nos teus ombros.
No céu do teu país, as estrelas podem ser barcos,
se quiseres sulcar os mares do coração em desordem.


Perturbada pelo desacato das emoções,
utilizo um roteiro de artifícios para simular,
em cada madrugada, a cumplicidade dos deuses.
Mas, como silenciar as mãos que dobam
a brisa da manhã, no vórtice do tempo?
Não iludo a distância. É devagar que olho
para trás, à procura de mim. Cada vinco do rosto,
é um caminho onde a angústia se deteve.

A pouco e pouco, aloja-se-me no coração
a cicatriz da espera.
Alheio-me da minha cronologia porque o passado
se tornou permanente. Caminho tão perto do mar,
que Ulisses avalia a direcção do vento pelos vestígios
do meu respirar, lento ou apressado.

sexta-feira, 15 de maio de 2009


Quando, nos lábios, começa um continente,
suspenso no apelo líquido dos beijos,
há um barco que cresce nos meus olhos
e, entre búzios verdes, escrevo água.
Nunca a brisa se demora entre as dunas,
onde os barcos navegam sobre a espuma.
Tudo é secreto, se maio se repete
nas marcas da pureza recusada.
Um rosto ou um rio me fascinam,
quando a raiva e o sossego
me revelam a nascente
e, no meio das palavras,procuro apenas um gesto
ou uma sombra.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

toma nas tuas mãos o meu vôo,
as imperceptíveis asas recolhidas
à concha dos teus dedos.
sentes como estão trêmulas ,
como te tocam suaves?
é que todo vôo navega
até o porto.
depois é voragem,vertigem.
Que pena eu ter meu caminho
como um rio que corre sem misturar-se
como uma nuvem que passa sozinha
como uma estrada que segue sem bifurcar-se.
Que pena eu ser assim:
sem afluentes.
Sem parcerias.
Sem dono.
Sem encruzilhada.
E ter a cara inteira, não metade.
Que pena eu ser total,
não ter um trevo;
uma esquina
Uma paralela,
uma brecha.
Um espaço em mim,
que pena eu ser assim:
com divisas.
que pena eu ser assim:
um sem outro.
Como um único sol e uma só lua.
E não como as meias: aos pares.
em passos dispersos
por vezes inoportunos
sempre ao viés da vida
nos interstícios dos acasos
perpendicular a mim
por estradas
ora reais ora imaginadas
compulsivamente


caminho para me encontrar.
Venho de dentro, abriu-se a porta:
nem todas as horas do dia e da noite
me darão para olhar de nascente
a poente e pelo meio as ilhas.
Há um jogo de relâmpagos sobre o mundo
de só imaginá-la a luz fulmina-me,
na outra face ainda é sombra
Banhos de sol
nas primeiras areias da manhã
Mansidões na pele e do labirinto só
a convulsa circunvolução do corpo.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Subversivamente
o instinto me descomanda.
E a magia inconscientedo meu corpo
é um jogo clandestino
de gestos sem eco.
Há um ritual divino
nas carícias sensuais
em que me invento.
Nada me torna inocente
dos meus próprios sentidos
quando solto
as linhas marginais
do pensamento
e me seduzo
com gostos proibidos.
Sempre são excessivos os desejos de quem sonha
a vida toda num momento.
A solidão é como o vento.
É nos olhos dos mendigos
que a noite se prolonga por mais tempo.
Afasto, devagar,
dos ombros da manhã,
a lonjura de cera
implícita nos meus passos
como um aviso de asas.

Já não podem tardar
os dedos que sufocam o medo
nos degraus da noite,
contos de fada
vidrados nos meus pulsos,
ângulo ou curva
De ternuras ausentes,
sinal anterior
a qualquer contradição.

Sou, por instantes,
um sossegado insecto
na flor dos lábios.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

As minhas mãos mantêm as estrelas,
Seguro a minha alma para que se não quebre
A melodia que vai de flor em flor,
Arranco o mar do mar e ponho-o em mim
E o bater do meu coração sustenta o ritmo das coisas.

quinta-feira, 7 de maio de 2009


Oásis na penumbra
do rosto.
A solidão
mais próxima e distante.

quarta-feira, 6 de maio de 2009


INSACIEDADE
A minha fome é de dentro
e a minha sede é palavra
Tenho
um deus
só para mim
incarnado
na loucura
da minha lucidez
PEREGRINAÇÃO
Venho de longes mundos
Separam-me distâncias
Trago as madrugadas no meu ventre
E a liberdade das coisas inventadas
num mundo abstraído
em tempo.

sábado, 2 de maio de 2009

trago afogadas no azul
as palavras que diria.
mas o dia é maior que eu
o sol recusa subterfúgios.
não há recanto sem luz,
o mar entra-me pelos sentidos,
e eu me rendo.


será líquido meu destino
Coração é terra que ninguém vê

Quis ser um dia,
jardineira de um coração.
Sachei, mondei
- nada colhi.
Nasceram espinhos
e nos espinhos me feri.
Quis ser um dia,
jardineira de um coração.
Cavei, plantei.
Na terra ingrata nada criei.
Semeador da Parábola...
Lancei a boa semente a gestos largos...
Aves do céu levaram.
Espinhos do chão cobriram.
O resto se perdeu
na terra dura da ingratidão.
Coração é terra que ninguém vê
— diz o ditado.
Plantei, reguei,
nada deu, não.
Terra de lagedo, de pedregulho,
— teu coração.
Bati na porta de um coração.
Bati.
Bati.
Nada escutei.
Casa vazia.
Porta fechada,
foi que encontrei..........
Das palavras que tu dizes,
umas me dizes com a voz,
outras com as mãos,
outras com os olhos.
Em quais devo acreditar?
— Quanto me amas? Um milhão de alqueires?
— Oh, muito mais que isso, oh, muito mais.
— E amanhã? Talvez meio alqueire?
— Amanhã talvez nem isso.
— É esta, então, a aritmética do teu coração?
— Não; é o modo como o vento mede o tempo.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Talvez as águas em vertigem
me escondam o rosto e os pensamentos,
a alma e os sentidos do corpo todo.
Não olhes nem lhes toques:
perigo de morte,abismo de vida.
A conjura da sensibilidade e do pensamento,
por vezes, faz de mim um clandestino
que não sabe onde está.
Entre as duas sílabas
do amor
o indizível estremece.
Há um fulgor
tangivelmente sentido
no silêncio do vidro.
No interior luminoso
do último sonho,
dei contigo a sonhar:
confiante
e a respirar para o lado
mais íntimo do coração.