terça-feira, 31 de março de 2009

«Meu Deus, faz de mim um pássaro…
É tudo o que sempre desejei…
Um pássaro branco e ágil livre de vergonha,
de maldade e de medo da solidão,
e dá-me outros pássaros brancos com quem voar,
dá-me um céu tão grande e tão vasto que,
se eu nunca quiser descer para a terra,
não tenha que o fazer.»
....... Que poderei comprar para o vazio
deste anoitecer?
um pouco do meu sol?
daquele mar, um punhado de areia?

Se me perder ou fugir,
avisem ou citem assim:
procura-se cachorro que ladrava às estrelas,
à lua e ao silêncio.
Deve-se estar sempre embriagado. Nada mais importa.
Para que o horrível fardo do tempo não vos pese sobre os ombros
e vos faça pender para a terra, deveis embriagar-vos sem cessar.
Mas de quê?
De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa escolha.
Mas embriagai-vos!
E se um dia nos degraus de um palácio,
na erva verde de uma valeta,
na solidão baça do vosso quarto,
acordardes, já sóbrios,
perguntai ao vento, à onda, à estrela,
à ave, ao relógio, a tudo o que foge,
a tudo o que geme, a tudo o que rola,
a tudo o que canta, a tudo o que fala,
perguntai:
– Que horas são?
– São horas de vos embriagardes!
Para que não sejais os escravos martirizados do tempo,
embriagai-vos sem cessar.
De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa escolha.

sábado, 28 de março de 2009

DIFERENÇA HORÁRIA

..........De pessoa para pessoa
há uma diferença horária,de minutos,
segundos,menos de um segundo,quase imperceptível.
Uma diferença não assinalada pelos relógios.
Impossivel de medir,
a não ser pelo AMOR,
sempre tão desacertado.

SAUDADE OU O QUE ACONTECE COM O TEMPO

Não há presente a não ser saudade.
A substância de que somos feitos.
Um lugar crepuscular onde erramos
a ampulheta ferida do coração
no tempo em que ,
adivinhando o que somos,
fomos e seremos
o enigma de termos sido
CONSIDERAÇÃO SOBRE A IMPOSSIVEL
IMOBILIZAÇÃO DO TEMPO
Na fotografia fica o que nunca fomos
um instante,que nunca existiu.
A vida é feita de instantes
que nunca existiram.
Porque a vida é o tempo,é uma âncora,a fotografia,
contra a deriva da memória.
Com fotografias reconstruimos a nossa vida,
como numa banda desenhada,
ligando as várias imagens
pelo fio de uma fábula que,
tal como nas histórias,
é inventada.

Não tira os olhos do chão.
Como se seguisse um trilho
do qual não se pode distrair,
nem por um segundo.
Faz percursos sem sentido.
Segue numa direcção.
Pára.
Muda o sentido.
Regressa.
Segue noutra direcção.....
Incansável,
faz com os seus passos o (secreto)
mapa da sua solidão.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Atentas as mãos
cobrem os lugares
trocam os sitios e perdem os sinais
Desassossegam o coração
e mais:
despertam os silêncios que se entregam
Encontro ou desencontro
Não interessa.......
Mãos,doces
mãos,
boas
para o amor,
Para
a espantosa descoberta
da carne,
mãos trémulas,
infiltrando-se
pelas humidas fendas
do corpo,
até
tocarem
o fruto supremo
e
romperem
o frágil casulo
da alegria

Mãos
cálidas,como
o fogo,
prontas
a acalmar as feridas,
a
limpar
as tuas lágrimas,
a afagar-te
os cabelos machucados
pela vida,
mãos
disponiveis
para
a fraternidade


Mãos coléricas
iradas,
capazes
de fazer justiça
de vingar
o insulto,
de derrotar
a opressão,
restituindo
o fantástico brilho
da água
aos olhos
dos homens
Mãos a um tempo
ásperas e
sedosas,
como múcua,
tecendo,
nas noites sem lua,
a musica obsessiva,
cruel e apaziguante
dos tambores






Mãos aptas
para ensinar
as palavras,
as coisas,
mãos
pacientes
para mostrar
os caminhos emaranhados
da ciência,
para
iluminar
os mistérios indecifráveis
do tempo

Aqui estou eu
onde o vento faz a curva
.....a brisa aposentou-se?

quinta-feira, 26 de março de 2009


o corpo
conteúdo da brevidade escutada
a centelha a desabrochar
no toque.
Dei-me inteiro.
Os outros
fazem o mundo (ou crêem que fazem).
Eu sento-me na cancela,
sem nada de meu e
tenho um sorriso triste e
uma gota de ternura branda no olhar.
Dei-me inteiro.
Sobram-me
coração, vísceras e um corpo.
Com isso vou vivendo.

quarta-feira, 25 de março de 2009


"Há seres humanos que
quando lhes tiram o Sol,
o espaço, as estrelas, são
capazes de construir,
dentro de si mesmos outros sóis,
outros espaços, outras estrelas..."

terça-feira, 24 de março de 2009

Quando a infância é um jardim perdido
que se dilui nas sombras da memória
e o que vês em redor perdeu sentido
para o epílogo ajustado à história
que um dia te contaram ao ouvido,


o melhor a fazer é não teres medo
e tramares para a vida um novo enredo.
Descubro-me ainda
no que pensava
já ter encontrado
Estava um ar tão transparente,
que foram precisos óculos
para desfocar o mundo
e eu tornar a ver os dias
imprecisos, como sempre.
.......Vou procurar-me.
Talvez um dia
volte para jantar.

segunda-feira, 23 de março de 2009

corre
pelas ruínas de si
o corpo
ao relento da vida
dentro do corpo
lugares desconhecidos
estações ermas
onde deixou recados
e inventou
imóveis paisagens
que nenhum tempo
pode esgotar
escreveu memórias
enviou cartas
que ainda hoje
cruzam altíssimos céus
singulares oceanos
remotas geografias

sem que um nome
se levante
uma saudade
se acenda
ou uma resposta
se construa
mas corre
corre ainda
pelas ruínas
de si
o olhar
senhor dos horizontes
romeiro
das santas cidades
domador
das bestas ferozes
que nos ombros severos
sustentam a cúpula
dos sonhos
letais

e canta
melancólicos versos
que nas ruínas de si
ressoam
como o recitar das baleias
nos telhados febris
de uma casa
que guardasse a loucura


e vinha a luz
e guardava-te
e eu guardava-te
também
num lugar mais seguro
que uma fotografia
ou um poema

domingo, 22 de março de 2009


Desvio dos teus ombros o lençol
que é feito de ternura amarrotada,
da frescura que vem depois do Sol,
quando depois do Sol não vem mais nada...
Olho a roupa no chão: que tempestade!
há restos de ternura pelo meio,
como vultos perdidos na cidade
em que uma tempestade sobreveio...
Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo...
Mas ninguém sonha a pressa com que nós
a despimos assim que estamos sós!
venho dormir junto de ti
e o meu corpo é uma coisa diferente
do que se vê ou toca ou sente;
é, fora de mim,
essa coluna de ar onde respiro,
olhos que beijam o teu corpo exacto,
as muitas mãos que dobram o teu rosto.
Um deus que dorme,
um deus que dança,
e mais
que um mero deus,
o breve amor do tempo.
Tantas estradas retas
que vão dar no céu
e o caminho sinuoso
é o que me chama,
com seus buracos, pedras
e ausência de cruzes.
Estradas que não se cruzam
nem se sobrepõem.

Se sigo o caminho pior
que só faz mal a mim
e a mais ninguém
sou cobrado pela boca do mundo
que me fez chorar
me fez querer
roubou minha vida
meus sonhos retém
e que me aponta a estrada reta
...o caminho do bem.

Com o consentimento da neve
caminharei devagar.

Alguém haverá à espera junto do fogo
e eu, que estarei cega pelo frio,
farei paragens breves,
sacudirei o guarda-chuva
e começarei de novo.

O único segredo é não sentir-se
imensamente cheio de verdades.
Não aceitar nunca os convites
que o nevoeiro
sugere ao fazer ninho com os seus disfarces
de paisagem feliz, de grandes sonhos.

Alguém haverá que diga,
perdeu-se,
alguém sairá a procurar-me,
e levará o calor de uma garrafa
onde poderei mandar-te esta mensagem.

sábado, 21 de março de 2009



Que ninguém hoje me diga nada.
Que ninguém venha abrir a minha mágoa,
esta dor sem nome que eu desconheço
donde vem e o que me diz.
É mágoa.
Talvez seja um começo de amor.
Talvez, de novo, a dor e a euforia de ter vindo ao mundo.
Pode ser tudo isso, ou nada disso.
Mas não afirmo.
As palavras viriam revelar-me tudo.
E eu prefiro esta angústia de não saber de quê.

Sonhos meus, ateus,
que desde sempre almejo

meus lábios rudes nos teus
húmidos de desejo.



Um pingo,
a lágrima.
Um rosto sincero
que chora.
E triste,
vai indo.
Chovendo,
esquecendo
a chuva lá fora.

Rasgo os meus pensamentos em mil pedaços.
Mil pedaços são as partes em que coso…
Derivo em mim, como se já não me sentisse em mim.

Imagens que tento esquecer
Enquanto luares conspiradores me extenuam a alma,
0 teu rosto desperso entre auroras pérfidas
E doces brisas que me gelam os ossos…

Controlas a vontade que há mim,
De não querer acordar mais!
Bebo em sulcos ansiosos, o audível silêncio
Que me desperta devagar em tons monocórdicos

Não sei onde encontrar razões para não ouvir
O suave gemido da solidão…
Penso mesmo em não pensar,
A triste música balbucia, resta-me apenas me entregar…
Tu me fascinas e encantas
como o fazem as sereias
com navegantes intrépidos
de incauta inocência incrédulos dos perigos.
Me atraem teus mistérios
e teu canto me seduz
para mergulhar em teus domínios
me esquecer do que sou,
do que fui,
para somente
— ser
— em ti.
Ser forte sem fazer força.
Ser veloz sem sair do lugar.
Ser sábio sem nada saber.
Ser belo sem dar nas vistas.
Ser uma luz intensa que não cega.
Ser o amor que por ti
sinto
sem me alegrar nem sofrer
Tudo isto é o que eu queria
Ser Ser Ser Ser Ser


apenas Ser



....Escrevo uma flor
Não tem cheiro nem cor
Somente palavras
Sei que o vento leva
as palavras.
De mim para ti
de ti para mim

sexta-feira, 20 de março de 2009


"Vejo-me tombar
Por entre brumas de agitação anímica
Sucumbo com utopias
Criadas em nebulosas e entediantes noites de insónia
Alieno-me no vazio dos olhares
Para assim esconder a dor de existir
Para que serve acordar?... Viver?
...Se não tenho quem me proteja daquilo que sou"
"Nunca mais
Caminharás nos caminhos naturais.
Nunca mais te poderás sentir
Invulnerável, real e densa
-Para sempre está perdido
O que mais do que tudo procuraste
A plenitude de cada presença.
E será sempre o mesmo sonho,
a mesma ausência."
"Tenho frio…
Quando não caminho, quando não respiro
o ar que sai da tua boca.
E quando te caiu uma pestana,e pediste um desejo.
__________Em
cima
ou______________________________________________
Em baixo?
Tens frio, também,quando não há roupa quente
para o fogo fraco na mente
daquele que te retorce a massa
cerebral, sem bem nem o tal
frio.
E esguio que sempre foi esse teu corpo
respira agora o martírio de se
ver sozinho,
ainda que todos os restos
estejam___________________por
_____________perto.
Tenho frio,
segreda-me o teu peito,
rasgado, pagão,
à beira rio."
O meu corpo;
guloso
do açucar da tua boca
Tu!
incendiando a minha
vida
como um vulcão de lava
aberta
Eu sei : tu és
a minha proa
Um ombro que voa
quando lhe encosto
a cabeça


quinta-feira, 19 de março de 2009

não diziam nada
perpetuavam-se no silêncio
de memórias antigas
densas
como se alimentassem
escondidos sinais
dum tempo inocente
correndo alegrias
para um sol mais quente
tão só assim
diziam nada
voavam no silêncio pleno
que morava nas suas faces

...... À minha ilha falta-lhe água

para ser uma ilha......
........ pó
ouro
estrela longínqua
kalahari
sahara
esfinge..........

eis o sangue
a palpitação
a vida
o vinho
o desejo
a carne
o arrojo
a aventura
o canto
de vermelho se vestem os grandes poentes
e são a rosa e os lábios
o fogo vivo a paixão ardente.........


à volta
e tu
no meio
à volta
e tu
em cima
tu
por debaixo
de mim
à volta
e tu
no meio
das minhas mãos
de mim
no centro
por dentro
de mim
à volta
assim
tu
sempre
assim
dentro e fora
de mim
à volta
por dentro
no centro
de ti

quarta-feira, 18 de março de 2009




vem comigo esta noite,

vem...

que as estrelas cintilam no chão de cristal,

a lua sorri e espreita;

tudo é jovem,tudo é permitido...

vem dançar comigo num copo de absinto

e fazer amor com o olhar,

vem namorar com o meu sorriso

e sorrir entre um beijo roubado;

a musica toca

e os corpos vibram,

vai mais um copo!

embriaguemo-nos de sedução

e

bebamos sem pudores...

vem comigo esta noite,

vem...

rende-te,

entrega-te ao proibido;

porque somos nós que fazemos as regras

e somos nós que as quebramos

e o prazer é uma linha de horizonte,

sem fim,

sem barreiras...

então voemos esta noite

que a manhã só nos trará

o vazio de dois corpos,

perdidos no branco dos lençóis,

estranhos,

esquecidos,

para partir de novo...

vem comigo esta noite,

vem...



“vem...”

terça-feira, 17 de março de 2009


Fundamentalmente
é certo que existe
um silêncio por desvendar
em imagens que não sei olhar